domingo, 16 de janeiro de 2011

frio - O Terremoto

FRIO

Sentir o
dia nublado
de frio e
vento.



Sentir tua
falta
no meio da
noite
gélida e
triste.


Sentir a
angústia da
procura de
teu corpo
por entre
os lençóis inúteis
para minha libido.


Sentir que
a penumbra
acabe
trazendo de
volta, teu riso
teu corpo
para noites
mais quentes
no inverno
e no vento.

A Esperança - O Terremoto

A Esperança



"Car l'espoir, au contraire de ce qu'on croit, équivaut à la résignation. Et vivre c'est ne pas se résigner". (Noces. Albert Camus.)


Leonor pensava no sentido da esperança sentada à beira da lareira, no declínio da existência, imposto pelos anos. O que esperar dos dias que ainda teria pela frente? Sentia a lentidão das horas, as limitações físicas advindas da idade. Afinal, do alto dos seus oitenta e quatro anos, não podia se queixar da vida, do tempo já ido, dos contratempos, descompassos e surpresas.

Leonor realizara alguns sonhos de menina. Casou, teve filhos, netos. Ao tornar-se viúva soube preencher a ausência do marido com tarefas comunitárias, cursinhos de artesanato e convivência com amigos. Aposentada desde o sessenta e cinco anos, vivia o dia a dia entre as atribuições da casa e viagens de lazer.

Mas e agora? Lúcida e só, aprendera a não esperar. Não olhava para trás, recusava-se a viver de lembranças apenas. Queria continuar a ocupar seus momentos, até o último suspiro. Detestava pensar que era mortal. De emoções, necessitava sempre. Um dia após o outro não lhe bastava. Não podia se furtar ao desejo de usufruir de mais manhãs ensolaradas, mais noites tépidas de outono. Com as coisas terrenas, era o compromisso que lhe movia para o sentido de viver. Ao longo dos anos descobrira o cheiro da terra, aprendera a apreciar as coisas simples do cotidiano, as flores do jardim e a natureza toda.

O sonho e a esperança se mesclavam para Leonor, no ímpeto permanente de fugir da angústia, de olhar para frente sem pensar que a cada passo, que a cada segundo, suas chances terráqueas encolhiam.

Aquecida pelas brasas da lareira, no aconchego de sua sala de estar, sabia-se consciente da própria finitude. Qual seria o significado da esperança, senão a extensão dos atos repetitivos do cotidiano? Que importância teria a mesma agora? Leonor já não alimentava mais sonhos libidinosos, como quando ficou viúva. Soube administrar os próprios desejos e renúncias. Vivia com interesse o que a idade podia lhe proporcionar. Mas ensinaram-lhe a rezar, a ser paciente e tolerante. Não podia se rebelar. Pensava apenas que a esperança, para ela, não significava mais nada.

Tocou a campainha, do lado da poltrona, pediu os medicamentos para o problema circulatório de que sofria afastando qualquer possibilidade de crença em alimentar ilusões em relação à própria vida.
Levantando a cabeça, olhou firme para Ana, sua acompanhante, e perguntou:
-Afinal, o que significa a esperança?

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Visita - Celina Hamilton Albornoz

Visita



Nesta mesma data, há tempos, me alojava na preguiça do entre festas e a tíbia brisa do verão. Costumava chegar à casa da tia e encontrá-la na penumbra para espantar o mormaço, envolta em perfume de flores que enchiam os vasos distribuídos pela casa. Seus pés pousavam em um puff, os braços encremados, as veias da mão salientes se destacando entre as jóias que a enfeitava. Possuía um anel com uma pedra opaca, azulada, uma água marinha lapidada de forma inesperada, moderna. E a pulseira de placas com esmeraldas. Não tudo usado junto, claro, mas a memória, sôfrega, mais rápida do que as lembranças, fica louca para trazer todos os detalhes e os mistura. Nem sei de onde veio o sentimento reconfortante, o abraço terno que talvez em vida eu nunca tenha recebido dela e que hoje, por causa do ar morno entrando pela janela, do sentimento que me fez voltar ao antigamente, sinto me apertando carinhosamente os braços. Feliz como eu era então naquela contingência, permeada pela realidade, verdadeira, a sensação está comigo. Trago em mim, como diria Fernando Pessoa, todos os sentimentos que há no mundo. De vez em quando, abro a porta e eles vêem me visitar.

Celina Hamilton Albornoz

Cadeira n° 28

sábado, 8 de janeiro de 2011

DESESPERANÇA - O Terremoto

DESESPERANÇA





Por que, não entender
a desesperanaça contida
em dias tão lúgubres?




Por que, não aceitar
a tristeza
nos olhos alheios?


Por que, não entender
os atalhos da existência,
da vida que se
arrasta sem rumo?



Por que, ver a vida
de forma tão fútil,
sem respeitar a
dor dos que sofrem
sem acreditar em um
mundo mais justo
e solidário?

A Esperança - O Terremoto

                                      A ESPERANÇA


            
                       "Car l'espoir, au contraire de ce qu'on croit, équivaut à la résignation. Et vivre c'est ne pas se résigner." Noces - Albert Camus.



           Leonor pensava no sentido da esperança sentada à beira da lareira, no declínio da existência imposto pelos anos. - O que esperar dos anos que ainda teria pela frente? Sentia a lentidão das horas, as limitações físicas advindas da idade. Afinal, do alto dos seus oitenta e quatro anos, não podia se queixar da vida, do tempo já ido, dos contratempos, descompassos e  surpresas.
          Leonor realizara alguns sonhos de menina. Casou, teve filhos, netos. Ao tornar-se viúva soube preencher a ausência do marido com tarefas comunitárias, cursinho de artesanato e convivência com amigos. Aposentada do magistério desde os sessenta e cinco anos, vivia o dia a dia entre as atribuições da casa e viagens de lazer.
        - Mas e agora? Lúcida e só, aprendera a não esperar. Não olhava para trás, recusava-se a viver de lembranças, apenas. Queria continuar a preencher seus momentos até o último suspiro. Detestava pensar que era mortal. De emoções, necessitava sempre. Um dia após o outro não lhe bastava. Não podia se furtar do desejo de usufruir de mais manhãs ensolaradas, mais noites tépidas de outono. Com as coisas terrenas, era o compromisso que lhe movia para o sentido de viver. Ao longo dos anos descobrira o cheiro da terra, aprendera que o cotidiano podia ser simples, como apreciar as flores do jardim e a natureza toda.
          O sonho e a esperança se mesclavam para Leonor, no ímpeto permanente de fugir da dor, de olhar para a frente sem pensar que a cada passo, que a cada segundo, suas chances terráqueas encolhiam.
         Aquecida pelas brasas da lareira, no aconchego  de sua sala de estar, sabia-se consciente da própria finitude. -Qual seria o significado da esperança, senão a extensão dos atos repetitivos do cotidiano? - Que im portância teria a mesma agora? Leonor não alimentava mais sonhos eróticos ou libidinosos, quando à época em que ficou viúva. Soube administrar os própios desejos e renúncias. Vivia com interesses que a idade podia lhe proporcionar. Mas ensinaram-lhe a rezar, a ser paciente e tolerante. Não podia se rebelar. Pensava, apenas, que a esperança, para ela, não significava mais nada.
        Tocou a campainha, do lado da poltrona, pediu os medicamentos para o problema circulatório que sofria e afastava qualquer possibilidade de crença em alimentar ilusões em relação à própria vida.
    Levantando a cabeça, olhou firme para Ana, sua acompanhante, e perguntou:
    -Afinal, o que significa a esperança?