sábado, 8 de janeiro de 2011

A Esperança - O Terremoto

                                      A ESPERANÇA


            
                       "Car l'espoir, au contraire de ce qu'on croit, équivaut à la résignation. Et vivre c'est ne pas se résigner." Noces - Albert Camus.



           Leonor pensava no sentido da esperança sentada à beira da lareira, no declínio da existência imposto pelos anos. - O que esperar dos anos que ainda teria pela frente? Sentia a lentidão das horas, as limitações físicas advindas da idade. Afinal, do alto dos seus oitenta e quatro anos, não podia se queixar da vida, do tempo já ido, dos contratempos, descompassos e  surpresas.
          Leonor realizara alguns sonhos de menina. Casou, teve filhos, netos. Ao tornar-se viúva soube preencher a ausência do marido com tarefas comunitárias, cursinho de artesanato e convivência com amigos. Aposentada do magistério desde os sessenta e cinco anos, vivia o dia a dia entre as atribuições da casa e viagens de lazer.
        - Mas e agora? Lúcida e só, aprendera a não esperar. Não olhava para trás, recusava-se a viver de lembranças, apenas. Queria continuar a preencher seus momentos até o último suspiro. Detestava pensar que era mortal. De emoções, necessitava sempre. Um dia após o outro não lhe bastava. Não podia se furtar do desejo de usufruir de mais manhãs ensolaradas, mais noites tépidas de outono. Com as coisas terrenas, era o compromisso que lhe movia para o sentido de viver. Ao longo dos anos descobrira o cheiro da terra, aprendera que o cotidiano podia ser simples, como apreciar as flores do jardim e a natureza toda.
          O sonho e a esperança se mesclavam para Leonor, no ímpeto permanente de fugir da dor, de olhar para a frente sem pensar que a cada passo, que a cada segundo, suas chances terráqueas encolhiam.
         Aquecida pelas brasas da lareira, no aconchego  de sua sala de estar, sabia-se consciente da própria finitude. -Qual seria o significado da esperança, senão a extensão dos atos repetitivos do cotidiano? - Que im portância teria a mesma agora? Leonor não alimentava mais sonhos eróticos ou libidinosos, quando à época em que ficou viúva. Soube administrar os própios desejos e renúncias. Vivia com interesses que a idade podia lhe proporcionar. Mas ensinaram-lhe a rezar, a ser paciente e tolerante. Não podia se rebelar. Pensava, apenas, que a esperança, para ela, não significava mais nada.
        Tocou a campainha, do lado da poltrona, pediu os medicamentos para o problema circulatório que sofria e afastava qualquer possibilidade de crença em alimentar ilusões em relação à própria vida.
    Levantando a cabeça, olhou firme para Ana, sua acompanhante, e perguntou:
    -Afinal, o que significa a esperança?

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